Capítulo 10
ENTENDIMENTO INTERCULTURAL POR MEIO DE ATIVIDADES TELECOLABORATIVAS Rodrigo Schaefer Christiane Heemann DOI 10.22533/at.ed.75319180410
- RESUMO | ABSTRACT
- 1 | INTRODUÇÃO
- 2 | FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E APRESENTAÇÃO DOS MODELOS DE TELECOLABORAÇÃO
- 3 | ALGUMAS CONSIDERAÇÕES E ENCAMINHAMENTOS
- REFERÊNCIAS
RESUMO | ABSTRACT
RESUMO: No contexto de ensino e aprendizagem de línguas estrangeiras, é necessário os aprendizes compreenderem comportamentos, perspectivas e valores de outras culturas (BYRAM, 1997), o que pode favorecer, de acordo com Bredella (2002), um entendimento intercultural. A Internet tem favorecido o ensino de línguas estrangeiras em virtude de seu potencial de proporcionar contato virtual com falantes de outras línguas e culturas. A telecolaboração, definida como a utilização de tecnologias online para o desenvolvimento de habilidades linguísticas através da interação com pessoas de outras culturas (O’DOWD, 2013), permite que os aprendizes discutam diferentes assuntos interculturais. O presente estudo, o qual se fundamenta em autores como Byram (1997, 2016); Kramsch (1993, 1998, 2005); O’Dowd (2003, 2006, 2013) e Telles (2009, 2011, 2015), tem dois objetivos: 1) apresentar três modelos de telecolaboração que, na intenção de promover um entendimento intercultural dos aprendizes de língua estrangeira no Ensino Superior, adotam a abordagem intercultural; 2) mostrar como pretendemos, no semestre seguinte, aplicar atividades telecolaborativas em aulas do Ensino Superior.
ABSTRACT: In the context of teaching and learning foreign languages, it is necessary that learners understand behaviors, perspectives and values of other cultures (BYRAM, 1997), which can foster, according to Bredella (2002), an intercultural understanding. The Internet has favored the teaching of foreign languages due to its potential to provide virtual contact with speakers of other languages and cultures. Telecollaboration, defined as the use of online technologies for the development of linguistic abilities through interaction with people from other cultures (O’DOWD, 2013), allows learners to discuss different intercultural issues. This study, which is based on authors such as Byram (1997, 2016); Kramsch (1993, 1998, 2005); O’Dowd (2003, 2006, 2013) and Telles (2009, 2011, 2015), has two objectives: 1) to present three models of telecollaboration that, with a view to promoting an intercultural understanding of foreign language learners in Higher Education, adopt an intercultural approach and; 2) to show how we intend, in the following semester, to apply telecollaborative activities in Higher Education classes.
1 | INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas, o uso de tecnologias digitais no ensino de línguas estrangeiras, favorecido pelo advento da Internet, tem se destacado. Conforme Luna e Schaefer (no prelo), os recursos da Internet têm se mostrado como possibilidades de desenvolvimento linguístico.
Segundo O’Dowd (2013) “uma das principais contribuições da Internet para o ensino de língua estrangeira tem sido o seu potencial para proporcionar aos aprendizes de línguas um contato virtual com membros de outras culturas e com falantes de outras línguas” (p.123, tradução nossa). Dentre várias maneiras de possibilitar o referido contato, uma delas é através da telecolaboração, definida por O’Dowd (2013) como “a aplicação de ferramentas de comunicação on-line para encontro de aprendizes de línguas em locais geograficamente distantes para desenvolver suas habilidades em língua estrangeira e sua competência intercultural através de tarefas colaborativas e trabalho de projeto” (p.123, tradução nossa).
O’Dowd (2003) afirma que os aprendizes, por meio de atividades em ambientes telecolaborativos, podem “refletir criticamente sobre sua própria cultura mediante perguntas feitas pelos seus parceiros” (p. 134, tradução nossa). De tal modo, o interesse do professor de línguas pode recair não só no desenvolvimento linguístico dos alunos, mas também na promoção do entendimento intercultural. Sobre isso, O’Dowd (2006) enfatiza que:
Além de conhecimento e interesse por outras culturas, a interação intercultural eficaz inclui as habilidades de ser capaz de descobrir e entender o significado simbólico que é atribuído ao comportamento em diferentes culturas. Envolve também a consciência de que a sua própria maneira de ver o mundo não é natural ou normal, mas culturalmente determinada. (p. 86, tradução nossa, grifos do autor).
Embora autores como Lewis e O’Dowd (2016), Kramsch e Thorne (2002) e Ware e Kramsch (2005) ressaltem que o desenvolvimento da compreensão intercultural nos espaços online tem recebido relativamente pouca atenção, há modelos e projetos de telecolaboração que de fato incorporam a abordagem intercultural em suas atividades. Portanto, este estudo, o qual se encontra em desenvolvimento, tem dois objetivos: 1) apresentar três modelos de telecolaboração que visam à promoção do entendimento intercultural dos aprendizes de língua estrangeira no Ensino Superior e; 2) mostrar como pretendemos, no semestre seguinte, aplicar atividades telecolaborativas em aulas do Ensino Superior. Na próxima seção, apresentamos o arcabouço teórico assim como exemplos de modelos telecolaborativos.
2 | FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E APRESENTAÇÃO DOS MODELOS DE TELECOLABORAÇÃO
No contexto de ensino e aprendizagem de língua estrangeira, existe uma crescente necessidade de os aprendizes compreenderem comportamentos, perspectivas e valores de outras culturas (BYRAM, 1997; KRAMSCH, 1993, 2005). Tal compreensão pode ser facilitada através de uma abordagem intercultural (BYRAM, 1997; CORBETT, 2003; CROZET; LIDDICOAT, 1999; FANTINI, 2006; GIMENEZ, 2006; KRAMSCH, 1993, 1998, 2005).
Para Fantini (2006), competência intercultural está relacionada a “um complexo de habilidades necessárias para desempenhar efetiva e apropriadamente a interação com outros indivíduos os quais são linguística e culturalmente distintos” (p.12, tradução nossa). Nesta perspectiva, uma abordagem intercultural pode contribuir para a transcendência das limitações da visão de mundo do indivíduo.
Bredella (2002) define entendimento intercultural como a habilidade de “reconstruir o contexto do estrangeiro, levar em conta a perspectiva dos outros e ver as coisas através de seus olhos. Isso implica que somos capazes de nos distanciar de nossas próprias categorias, valores e interesses” (p. 39, tradução nossa). Por este ângulo, Kramsch (2005) sublinha que a abordagem intercultural deve proporcionar “consciência e respeito em relação à diferença, bem como a capacidade socioafetiva de se ver através dos olhos dos outros” (p. 553, tradução nossa).
Considerando que existe a possibilidade de lidar com assuntos interculturais em projetos de telecolaboração (BELZ, 2002), a seguir apresentaremos três modelos de telecolaboração. Evidentemente, é necessário deixar claro que tais modelos têm incluído a abordagem intercultural a fim de fomentar o entendimento intercultural (BREDELLA, 2002) ou competência (comunicativa) intercultural (BYRAM, 1997; FANTINI, 2006; KRAMSCH, 1993, 2005).
O projeto The Cultnet Intercultural Citizenship, tendo recebido os passos iniciais em Dorham, Inglaterra, é resultante da colaboração entre membros de uma rede informal de pesquisadores interessados no ensino de línguas estrangeiras e sua dimensão intercultural. Segundo Byram (2016), o objetivo do projeto é compreender como a educação para a cidadania pode ser incluída no ensino e aprendizagem de línguas através de subprojetos. Esses subprojetos envolvem alunos e professores de escolas secundárias e universidades em treze países e emergiram a partir de informações disponibilizadas numa página online. Tendo como base a teoria de cidadania e criticidade, o autor salienta que os subprojetos deveriam preparar os aprendizes de línguas estrangeiras para conhecer e aprender aspectos relacionados a diferentes culturas, o que pode propiciar o entendimento intercultural.
Outro projeto de telecolaboração é o The Cultura Exchange Programme, concebido por Furstenberg na MIT (Massachusetts Institute of Technology), Estados Unidos, um ambiente híbrido de aprendizagem. Furstenberg (2016) explica que o objetivo deste projeto é facilitar o entendimento intercultural entre seus alunos e de outros países. Assim dito, The Cultura Exchange Progra visa ensinar língua e cultura como algo indissociável e, conforme a autora, sua intenção é de permitir que os aprendizes estejam constantemente em contato com diferentes realidades culturais. A base do projeto se estabeleceu em consequência de trocas interculturais realizadas por meio da comparação de filmes. Algum tempo depois, os organizadores do projeto introduziram questionários assim como outros instrumentos para propiciar a comparação de assuntos interculturais, a saber: notícias de jornais, documentos oficiais, pesquisas de opinião, entre outros.
O terceiro projeto de telecolaboração é o Teletandem Brasil: Línguas estrangeiras para todos (de agora em diante TTB). O TTB é definido por Telles (2015) como “um contexto virtual, autônomo e colaborativo no qual dois falantes de línguas diferentes utilizam recursos de tecnologia VOIP (texto, voz e imagem de webcam) para ajudar o parceiro a aprender a sua língua materna (ou língua de proficiência)” (p. 604). Criado em 2006 e desenvolvido por uma universidade do estado de São Paulo, o objetivo deste projeto é propiciar o contato entre alunos brasileiros e de outros países. Existem três princípios norteadores do teletandem: reciprocidade, autonomia e uso separado das línguas (TELLES, 2009). As sessões online acontecem via Skype. Em 2011, o TTB incorporou o componente cultural.
Para Telles (2011), são necessárias mais pesquisas no contexto do teletandem com o intuito de compreender questões relacionadas à cultura / interculturalidade. Oportunamente, um dos autores do presente trabalho está desenvolvendo uma investigação de doutorado com o objetivo de compreender como ocorre a construção do entendimento intercultural no teletandem e de identificar quais características podem promover e quais podem obstaculizar esse entendimento.
Após descrição relativa a três modelos de telecolaboração no contexto de ensino e aprendizagem de língua estrangeira os quais lidam com a promoção do entendimento intercultural, passamos a tecer algumas considerações e explicar como pretendemos dar seguimento a este estudo.
3 | ALGUMAS CONSIDERAÇÕES E ENCAMINHAMENTOS
Para professores de línguas do Ensino Superior, propiciar a seus alunos o contato com falantes da língua estrangeira é, muitas das vezes, bastante difícil. Neste sentido, tendo em vista que para O’Dowd (2006) as tecnologias online podem favorecer referido contato, mostramos a seguir como pretendemos, no semestre seguinte, aplicar atividades telecolaborativas em aulas do Ensino Superior.
Conforme O’Dowd e Lewis (2016), um dos níveis para integração da telecolaboração do Ensino Superior é chamado de “integração na sala de aula”, em que as atividades são integradas no programa do curso e os alunos recebem créditos de participação. Por conseguinte, nos próximos semestres, pretendemos desenvolver atividades telecolaborativas nos cursos de Comércio Exterior e Ciência da Computação na Universidade do Vale do Itajaí (Univali). Cientes de que “ao mover-se de uma cultura para outra o aprendiz de línguas se transforma num ‘aprendiz intercultural’, e, como tal, necessitará de uma abordagem intercultural em seu aprendizado” (HANNA, 2015, p. 2), nossa ênfase recairá não só no desenvolvimento linguístico, mas também na promoção do entendimento intercultural.
Selecionamos tais cursos para desenvolvimento dessas atividades porque um dos autores deste trabalho faz parte do quadro de professores da universidade mencionada, dada a possibilidade real de implementação de atividades telecolaborativas. De tal modo, articularemos uma disciplina de cada curso, de modalidade presencial, com atividades telecolaborativas. Algumas dessas atividades serão realizadas em sala e outras em momentos extraclasse. Existem duas possibilidades para implementação das atividades com o objetivo de promover o contato entre os alunos da universidade brasileira e os de universidades estrangeiras: 1) através da utilização do Skype, como o faz o TTB, descrito anteriormente, e/ou; 2) através da utilização de websites como o The Evaluate Project ou o Schoology, plataformas que permitem práticas telecolaborativas com universidades em várias partes do mundo.
Em suma, quando do surgimento da parceria telecolaborativa, temos a intenção de coletar dados das diferentes atividades telecolaborativas. Além disso, pretendemos divulgar, em forma de artigos, capítulos de livros e apresentações, estudos que abordem a promoção do entendimento intercultural dos aprendizes de língua estrangeira nesses espaços telecolaborativos.
REFERÊNCIAS
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